O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, descartou, nesta segunda-feira (14/8), mudanças nas compras parceladas “sem juros” no cartão de crédito, ao menos por ora. Um grupo de trabalho estuda alternativas para solucionar a inadimplência e as altas taxas cobradas no crédito rotativo, que em junho alcançaram 437,3% ao ano. A ideia do fim do parcelamento seria defendida pelos bancos.
No rotativo, o consumidor pode optar por adiar parte da fatura para o mês seguinte, pagando apenas um valor mínimo. Como os juros são elevados, muita gente acaba não conseguindo quitar a dívida.
“Nosso foco é o crédito rotativo. Tenho o compromisso dos bancos de que essa mesa de negociação tem prazo para terminar”, afirmou Haddad, referindo-se ao grupo de trabalho criado para tratar a questão. Participam do grupo representantes do ministério da Fazenda, do Banco Central, da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) e do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IBV).
O grupo estabeleceu o prazo de 90 dias para apresentar uma proposta, que pode incluir o fim do rotativo. As negociações envolvem também o diálogo com o Congresso sobre o assunto, uma vez que existe, na Câmara, um Projeto de Lei tratando do assunto. O grupo de trabalho, segundo Haddad, mantém conversas com tanto com o autor do PL, Elmar Nascimento (União-BA) e com o relator, deputado Alencar Santana (PT-SP).
O tema do parcelamento sem juros foi colocado em público na quinta-feira da semana passada, quando o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, falando em sessão no Senado, afirmou que, além do rotativo, seria necessário resolver o parcelamento em muitas vezes sem juros, que aumenta o risco dos bancos. A ideia, segundo ele, seria criar mecanismos para “desincentivar” o parcelamento sem juros em prazos tão longos.
“A gente tem um parcelado sem juros, que ajuda muito o comércio, que ajuda muito a atividade, mas que tem aumentado muito o número de parcelas, de três para cinco, para sete, para nove, para onze. Hoje, o prazo médio são 13 parcelas. Então, é como se fizessem um financiamento de longo prazo sem juros”, comentou Campos Neto.
Nesta segunda-feira, Haddad afirmou que prefere não misturar os dois assuntos. “O rotativo afeta muito a vida das pessoas e o parcelado sem juros responde hoje por 70% das compras feitas no comércio. Então, temos que ter muito cuidado para não afetar as compras no comércio, e não gerar outro problema para resolver o primeiro”, ponderou o ministro. “Nós herdamos uma taxa de juros absurda do rotativo e vamos ter que equacionar, mas isso não passa por prejudicar o consumidor que está pagando as suas contas em dia”, completou o ministro.
A questão do rotativo e do parcelamento divide também entidades do mercado financeiro. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e a Associação Brasileira de Internet (Abranet) abriram uma polêmica sobre os juros exagerados do cartão de crédito.
Enquanto a Febraban justifica que um dos motivos de os juros do cartão serem tão altos é o parcelamento sem juros — uma “distorção do mercado brasileiro” —, a Abranet defende a operação e ressalta que o parcelamento é responsável por 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Ontem, Campos Neto teve reunião a porta fechadas com representantes do setor financeiro para tratar do assunto.
Em nota, o presidente da Febraban, Isaac Sidney, afirmou que os bancos não têm qualquer pretensão de acabar com as compras parceladas no cartão de crédito, mas defendeu um “redesenho” do rotativo e o “aprimoramento do mecanismo de parcelamento” de compras. “Estudos indicam a necessidade de medidas de reequilíbrio do custo e do risco de crédito. Para tanto, é necessário debater a grande distorção que só no Brasil existe, em que 75% das carteiras dos emissores e 50% das compras são feitas com parcelado sem juros”, destaca o comunicado.
Segundo Sidney, o prazo de financiamento impacta diretamente no custo de capital e no risco de crédito, “e a inadimplência das compras parceladas em longo prazo é bem maior do que na modalidade à vista”.
A Abranet, por sua vez, informou que é contrária à proposta de encarecer e limitar as compras parceladas sem juros no cartão de crédito, porque isso vai prejudicar os lojistas, os consumidores e a economia do país.
“Os grandes bancos já tentaram, no passado, acabar com as compras parceladas, também conhecidas como Parcelado sem Juros (PSJ). Com a reação de comerciantes (principalmente os menores) e de consumidores, o assunto foi abandonado — mas ressurge de tempos em tempos. E para não falar em acabar com o PSJ, a estratégia agora é mais inteligente: encarecer e limitar o PSJ, cobrando mais taxas quanto mais parcelado for o pagamento, e diminuindo a quantidade de parcelas disponíveis para o consumidor. Na prática, significa reduzir e, com o tempo, acabar com o PSJ”, destaca nota da Abranet. (Colaborou Rosana Hessel)
Fonte: Correio Braziliense