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Publicado em 08/02/2017
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A CRISE DO EGO

O governador Paulo Hartung iniciou seu terceiro mandato com a intenção de viabilizar-se como candidato a presidente ou a vice-presidente da República em 2018. 

Sabedor de que qualquer candidatura precisa, para seu amadurecimento, do apoio de investidores e banqueiros, locais e internacionais, tratou de fazer do Espírito Santo o laboratório de experimentos fiscais com o fim de causar boa impressão. Faz parte desse projeto o esforço para alçar a ex-secretária de fazenda estadual à condição de Secretária do Tesouro Nacional e também o resgate de um diplomata de brilho opaco para ocupar a Casa Civil de seu governo. Mesmo sem expressividade na diplomacia, o secretário tem seus contatos que podem auxiliar nas abordagens para a venda do projeto e das realizações no laboratório conhecido como Espírito Santo.

No quesito austeridade fiscal, sobrou ambiguidade. Generoso com certas carreiras (das quais depende para sustentar as diatribes legislativas), não fez qualquer oposição à prodigalidade do Poder Judiciário, que descumpriu todos os limites legais, criando despesas absurdas e/ou inconstitucionais. Com outras carreiras, impôs limites vergonhosos.

A crise de segurança a que se assiste agora vem de sua política irresponsável e incoerente de contenção das despesas com pessoal do Poder Executivo, aos quais sonega a obrigatória revisão anual de vencimentos. Além disso, sem qualquer fundamento normativo, trata os seus vencimentos como teto para os vencimentos dos demais servidores do Executivo.

E aqui revela uma face duplamente censurável, pelo cinismo e pela suposta ignorância. O cinismo vem do fato de que, não sendo ele tecnicamente um servidor público e sim um agente público, seus vencimentos não deveriam operar como teto. Além dos vencimentos mensais, é ele, governador, brindado com diversas vantagens próprias do cargo, o que inclui o custeio pelo erário de despesas com moradia, transporte, segurança, alimentação e diversos gastos suportados com cartões de crédito pagos com dinheiro público. A falta de isonomia torna ética e moralmente censurável o abate-teto baseado nos vencimentos formais do governador. Há mais, porém.

A ignorância está no descuido com as normas constitucionais, as quais não autorizam que o teto de remuneração do pessoal do Executivo seja determinado pelos vencimentos do próprio governador, visto que o governo e sua procuradoria jamais produziram norma para sanar a omissão normativa. O texto em vigência, hoje, aponta para o salário de ministro do Supremo Tribunal Federal como limite de vencimentos. Há, portanto, uma falha normativa decorrente de omissão que implica no descumprimento da Constituição e no abuso de poder por uso de limite sem previsão legal.

Piscando com o outro olho para aqueles que podem patrocinar sua pretensão para 2018, o governador tratou de criar mecanismos de blindagem para aqueles que, simulando ou realmente investindo na economia local, receberem vantagens fiscais. A primeira medida de proteção desses investidores foi a supressão do artigo 145, da Constituição do Estado, o qual determinava a obrigação de transparência por meio de da publicação dos nomes das empresas beneficiárias e também o valor dos benefícios concedidos, tudo dentro dos 180 dias subsequentes ao término do exercício financeiro.

A vontade do governador era criar um paraíso do sigilo fiscal sob a alegação pífia de estratégia contra a guerra fiscal. Em sua estratégia de bajulação de investidores, ninguém poderia conhecer as empresas titulares das vantagens asseguradas pelos contratos de competitividade (COMPETE-ES), pelo Programa de Incentivo ao Investimento (INVEST-ES) e, com maior risco, aquelas premiadas com os regimes especiais concedidos sem muito critério pela Secretaria da Fazenda.

A estratégia de sedução dos potenciais apoiadores se completa com o enfraquecimento do Estado, que deve ser mínimo na visão ideológica do governador e daqueles cujo apoio ele persegue. Basta que observe o que tem sido feito com algumas carreiras de estado, a exemplo daquelas que compõem o grupo TAF (Tributação, Arrecadação e Fiscalização), para que se perceba: o Espírito Santo virou o laboratório de experimentação das políticas públicas que Paulo Hartung, assim, promete implementar no Brasil, caso seu sonho se realize. 

O que se vive aqui, hoje, poderemos viver nacionalmente amanhã. Crises são os efeitos de qualquer administração irresponsável, guiada por cabeças de Excel e alheias ao mundo real.