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Publicado em 13/02/2017
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O Ajuste Fiscal de PH e o início do Colapso no Serviço Público

O estado do Espírito Santo viveu nos últimos dias um dos momentos mais caóticos de sua já secular história. A manifestação liderada e organizada pelas famílias dos policiais, que resultou na paralisação das atividades da Polícia Militar desde o penúltimo sábado (dia 4 de fevereiro), em legítima reivindicação por melhores salários e condições de trabalho, ocasionou a multiplicação de ocorrências delitivas e a generalização de um sentimento de medo e insegurança entre a população capixaba, exacerbada ainda mais pelo fato do Estado ter ficado três dias sem comando. Mesmo com rumores do início do movimento da PM já na sexta-feira (03) o Senhor Governador se licenciou de suas atividades sem passar o comando para o vice-governador, o que revela mais uma vez seu estilo tirânico. Restou evidente também sua inabilidade para o diálogo ao rechaçar de plano qualquer possibilidade de negociação com os familiares dos policiais, sob os argumentos da falta de dinheiro e da crise econômica que assola o país. São catastróficos os efeitos produzidos pela crise na segurança pública, de inteira responsabilidade do Governo do Estado: as estatísticas já contabilizam mais de 140 mortes e mais de 350 furtos e roubos de veículos em uma semana de barbárie.

O triste episódio tem servido para explicitar o descaso do Governo Estadual para com os servidores públicos do Poder Executivo. As mesmas manchetes que exaltam o superávit de R$ 40 milhões de reais no ano de 2016 são as mesmas que ocultam, com estratégica conveniência, o arrocho sobre os servidores estaduais. Já são dois anos sem a revisão geral dos vencimentos, assegurada tanto pela Constituição Federal quanto pela Constituição Estadual, impondo aos trabalhadores a corrosão inflacionária do seu poder de compra. O ajuste fiscal – sem nenhuma reforma estruturante que o justifique, uma vez que se baseou apenas em corte de despesas – e que enseja o propagandeado e farsesco discurso do “milagre das contas capixabas”, custa caro e quem paga o seu preço a duras penas é o funcionalismo público do estado do Espírito Santo.  Só que, nesse início de 2017, a política insana de esfolamento dos servidores propiciou a eclosão, com contornos de dramática brutalidade, de um efeito colateral que fez tremer o Império de Paulo Hartung. Nem mesmo a milionária aliança com segmentos dominantes da mídia local, os quais diuturnamente cumprem a função de eclipsar as contradições internas do Governo, foi capaz de camuflar os traumatismos legados pela crise de segurança pública deflagrada na última semana.

A análise acurada dos gastos públicos efetuados no atual mandato explicita que a escusa das dificuldades econômicas enfrentadas pelos estados da federação é relativa e manejada com cinismo e ardil pelo Governo. Mesmo em meio à aguda crise econômica que faz agonizar os brasileiros, Paulo Hartung teve disponibilidade de caixa para gastar R$ 19,6 milhões de reais com publicidade somente nos primeiros 11 meses de seu terceiro mandato (2015). No ano seguinte, esse montante foi sensivelmente ampliado. Apenas em 2016, os dispêndios públicos com propaganda ultrapassaram a marca de 73 milhões de reais. A previsão para 2017 é de algo em torno de R$ 47 milhões. E não pararam por aí os gastos supérfluos. Tornou-se público recentemente que o Imperador gastou ainda cerca de R$ 3 milhões de reais com luxos e regalias, como camarões e queijos finos.

Em idêntico sentido, também não parece apertado o orçamento do Governo quando o assunto é renúncia fiscal. Está prevista a não arrecadação de aproximadamente R$ 4,2 bilhões de reais nos quatro anos (2015-2018) do atual mandato de Paulo Hartung. A severidade e intransigência que o Governador opõe aos servidores públicos convertem-se na mais descarada generosidade quando do outro lado da mesa de negociação estão os empresários, especialmente aqueles inclinados e dispostos aos mais pródigos financiamentos de campanha. Só com esse valor renunciado seria possível recompor os salários de todo o funcionalismo público estadual, sobrando ainda um montante significativo para investir na melhoria dos serviços públicos ofertados à população capixaba.

Essa austeridade seletiva sinaliza, sintomaticamente, o alinhamento da atual composição do Governo Estadual com as tendências neoliberais de precarização do trabalho, seja no plano privado, seja no plano público. É parte integrante do projeto ideológico de Paulo Hartung a sonegação dos direitos assegurados pela Constituição aos servidores públicos, com o fito de ampliar o volume de capital ocioso para ser investido de acordo com seus caprichos pessoais e conveniências políticas. Os números deixam claro que o problema não é falta de dinheiro, e sim a inversão de prioridades por parte do Governo.

O quadro atual reforça também a importância da Receita Estadual como fonte de recursos para a implementação de políticas públicas (dentre elas as de segurança), para o equilíbrio das contas do Governo, para o trato digno dos servidores públicos e, em última instância, para o saudável funcionamento das instituições e do Estado. O rótulo de “bom gestor” atribuído ao governador sabe-se lá por quem, é supérfluo e descartável se não houver recursos para se administrar. Daí a indispensabilidade das carreiras que compõem o grupo TAF (Tributação, Arrecadação e Fiscalização), ostensivamente desvalorizadas pelo Governo Estadual e sem as quais se torna impossível a qualquer gestor realizar satisfatoriamente o trabalho que lhe compete. Só com a regular atuação dos Auditores Fiscais e Auxiliares Fazendários é que se pode evitar crises como a deflagrada no penúltimo sábado e que tem feito penar a população capixaba. Essas carreiras constituem, pois, um dos mais sólidos alicerces para a boa estruturação da vida social, como tratou de reconhecer a Constituição Federal, no artigo 37, inciso XXII, ao conferir à Administração Tributária a estatura de atividade essencial ao funcionamento do Estado.

Reside aqui mais uma das incongruências e incompatibilidades do Governo Paulo Hartung com os mandamentos constitucionais. Os Auditores Fiscais da Receita Estadual do Espírito Santo, a exemplo dos policiais militares capixabas, têm a pior remuneração (tanto no início quanto no final da carreira) dentre todos os estados da Federação Brasileira. Ainda assim, o Governador tem rejeitado sistematicamente qualquer tentativa de diálogo proposta pela categoria, relegando ao sucateamento e ao abandono o Fisco capixaba. Em recentes movimentos reivindicatórios dos Auditores Fiscais, Paulo Hartung postou-se de maneira idêntica ao que se tem visto no caso da paralisação dos policiais militares: intransigência, autoritarismo e descaso com os servidores públicos.

O fato é que a superação da crise fiscal ou ao menos a minimização de seus efeitos passará indubitavelmente pelo trabalho dos auditores. Um dos principais fatores do déficit arrecadatório brasileiro hoje é a sonegação fiscal. Um levantamento feito pelo grupo internacional Tax Justice Network, a partir de dados de 2011 do Banco Mundial, revelou que o Brasil é o segundo país do mundo no quesito evasão de tributos, perdendo apenas para a Rússia. Segundo os cálculos do Sindicato dos Procuradores da Fazenda Nacional (SINPROFAZ), cerca de R$ 500 bilhões de reais são sonegados anualmente no Brasil. O valor é sete vezes maior do que os rombos anuais provocados pela corrupção, que são estimados na casa de R$ 67 bilhões de reais.

Esses números alarmantes se devem ao sucateamento e ao desarrimo que recaem sobre o aparato de fiscalização e arrecadação tributária no Brasil. O déficit de pessoal encontra-se em situação crítica hoje no país e não há reposição dos quadros por parte dos governos, tanto na esfera federal, quanto na estadual. Essa conjuntura é particularmente grave no Espírito Santo, em virtude da flagrante desvalorização dos servidores, que prejudica sensivelmente o trabalho de arrecadação tributária e que contribui para insuflar uma já galopante prática de sonegação fiscal. O déficit atual no quadro de auditores fiscais da Receita Estadual é de aproximadamente 250 auditores e dentro de três anos esse número será de 400 auditores, em razão das aposentadorias iminentes.

Ainda assim, a despeito de todas essas dificuldades, os Auditores Fiscais do estado do Espírito Santo têm repetidamente mostrado a relevância do seu trabalho para a sociedade capixaba. Em recentes trabalhos de fiscalização, a Receita Estadual identificou esquemas de fraude e sonegação fiscal nos segmentos de rochas ornamentais, de bebidas e do café, com valores, respectivamente, na ordem de R$ 1,5 bilhão, R$ 450 milhões e R$ 1,7 bilhão de reais, todos já devidamente lançados nos autos de infração pertinentes. O trabalho dos auditores viabilizou também a entrada de mais de R$ 350 milhões de reais nos cofres públicos, provenientes de acordos extrajudiciais firmados com empresas do setor de petróleo sediadas no Estado, por intermédio do Programa de Recuperação Fiscal – REFIS.

A dramática crise na segurança pública, que provocou violenta convulsão social nesses últimos dias, desvelou o embuste em que se encontra enclausurada a sociedade capixaba. Em poucos dias, fez cair a máscara de Paulo Hartung e escancarou os problemas com os quais temos que lidar.  A desatinada política de ajuste fiscal, radicada sobre o estrangulamento silencioso do funcionalismo público estadual, era uma bomba relógio que explodiu na última semana. Dissolveu-se o discurso alegórico e mistificador do “milagre capixaba”. O Império de Paulo Hartung desmoronou e sob suas ruínas teremos que repensar os caminhos da nossa política.  

Por isso, diante desse cenário, o SINDIFISCAL-ES reitera o seu apoio e solidariedade à luta dos Policiais Militares do Espírito Santo e de seus familiares. É tempo de união dos servidores públicos para o combate à precarização do trabalho e aos desmandos do Imperador Paulo Hartung e de seus sequazes, que só cumprem a lei quando lhes é conveniente – faz letra morta ao disposto no art. 35, XVI da Constituição do ES, ao não iniciar o Projeto de Lei para instituir a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos – e sempre mantendo o especial destaque a importantes canais de comunicação da mídia capixaba, que, após se beneficiarem de milionários contratos, tornaram-se os mais fiéis e tenazes serviçais do Governo. Reafirmamos nosso compromisso com os Auditores Fiscais e Auxiliares Fazendários na luta por dignas condições de trabalho e por melhores salários, cientes e conscientes de que a prevenção de crises como a da segurança pública, dramaticamente sentida pelos capixabas nos últimos dias, só se fará possível com um FISCO FORTE e VALORIZADO.

A DIRETORIA