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Publicado em 03/10/2017
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Novo Refis abre brecha para corruptos parcelarem dívidas com descontos

Foto: Wilson Dias/Agência Brasil
Fonte: Congresso em Foco

Aprovado na última terça-feira (27) pelos deputados, o texto-base da medida provisória do programa de refinanciamento de dívidas com a União pode permitir que investigados parcelem suas dívidas com a União, apontou a reportagem do jornal O Globo deste sábado (30). Em nota (leia íntegra mais abaixo), o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) classificou a alteração como um “tapa na cara da nação”.

Uma mudança na redação permite que as dívidas de autuações de órgãos de controle sejam parceladas. Isso significa que investigados na Lava Jato vão poder dividir seus débitos em parcelas a perder de vista e terão redução de multas e juros. Segundo especialistas ouvidos pela repórter Gabriela Valente, o deputado Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG), relator da proposta, amarrou o texto de tal forma que seria impossível vetar o benefício sem derrubar a MP por completo.

A mudança foi feita pouco antes da votação da MP, por meio de uma emenda aglutinativa – que pode fundir o texto de uma emenda ao da proposta principal. O relator vinculou a Procuradoria-Geral da União, responsável por executar as cobranças desse tipo de dívida, no primeiro artigo da lei. Como não é possível vetar apenas palavras em um texto de lei, segundo uma fonte da AGU ouvida pela reportagem, seria impossível retirar somente termo “Procuradoria-Geral da União”. Dessa forma, todo o artigo teria de ser derrubado, que faria com que a lei não existisse mais e anularia o Refis.

Agora, os deputados têm nas mãos mais uma ferramenta de pressão contra o presidente Michel Temer, que precisa de votos na Casa para escapar da segunda denúncia apresentada contra ele.

Em causa própria

De acordo com levantamento da Coordenação-Geral de Estratégias de Recuperação de Crédito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), um grupo de deputados e senadores inscritos na Dívida Ativa da União é responsável por um rombo de R$ 1,4 bilhão nos cofres públicos (R$ 1.458.826.055,19, mais precisamente). Há ainda uma “relação de devedores da União que financiaram campanhas eleitorais” para a Câmara e Senado, entre pessoas físicas e jurídicas, muitas delas de propriedade dos próprios parlamentares ou apresentadas como partidos políticos.

O texto também foi distorcido a ponto de abrir possibilidade até de devolução de recursos a quem foi punido. O procurador da república junto ao Tribunal de Contas da União Marinus Marsico deu como exemplo o caso do ex-senador Luiz Estevão. Se resolvesse aderir ao Refis, Estevão, que fechou acordo com a Advocacia-Geral da União e já pagou aproximadamente R$ 350 milhões, poderia pedir que o governo devolvesse valores a ele.

Marsico declarou ao jornal que desviar dinheiro público passaria a ser um bom negócio. “Essa medida ofende o princípio da moralidade que a lei precisa ter. Vai beneficiar quem desviou recurso público e cometeu ato de corrupção.”

“Tapa na cara”

O Sindifisco criticou duramente o texto-base aprovado e pediu a derrubada total da MP. O texto aprovado, é “tapa na cara da nação”, um “estímulo à sonegação” e “um delicioso convite à inadimplência”, de acordo com a entidade.

Para o sindicato, a MP em vez de ajudar a melhorar as contas da União, vai impulsionar o prejuízo da arrecadação e criar um “ambiente de negócios tóxico”, dando margem para a concorrência desleal entre as empresas.

“A MP 783 é desrespeitosa, cínica. Ou é abortada ou estará confirmado que a Nau Brasil afunda mais rápido do que se possa perceber”, afirma a nota.

Leia a íntegra da nota divulgada pelo Sindifisco:

“Aprovação da MP do Refis é um tapa na cara da Nação. Não pode ir adiante

Brasília, 30 de setembro de 2017

Na noite de quarta-feira, por votação simbólica, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou o novo texto do Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória (MP) 783, que permite o refinanciamento de dívidas tributárias. Maus pagadores de longa data poderão continuar burlando os compromissos que todo cidadão de bem tem com os impostos, mola-mestra da construção de uma sociedade melhor, em qualquer lugar do mundo.

Essa MP não é somente um estímulo à sonegação. Impulsiona o prejuízo da arrecadação federal e favorece a concorrência desleal entre as empresas – tornando o ambiente de negócios no Brasil tóxico, para dizer o mínimo.

Entre os abusos aprovados está a permissão para que empresas que tenham débitos de parcelamentos anteriores, e que foram dele excluídos, adiram ao novo Refis. E se voltarem a ser afastadas por não honrarem o combinado, terão direito a discutir as razões da exclusão e não pagarão nada, até que haja uma decisão final. Em resumo, o contribuinte interrompe o fluxo do pagamento das parcelas e tudo bem.

Outro privilégio para o mau pagador: para dívidas até R$ 15 milhões, será permitida a utilização ilimitada da base de cálculo negativa da Contribuição Sobre Lucro Líquido (CSLL) e de prejuízo fiscal de exercícios anteriores, inclusive para débitos inscritos em dívida ativa. E quem paga tudo direitinho, como fica, se a lei permite o abatimento do prejuízo gradualmente, limitando o percentual a ser aplicado anualmente?

Para fechar, a MP prevê a redução de até 90% dos juros, 70% das multas e 25% dos encargos legais. Um delicioso convite à inadimplência; um castigo àquele que cumpre suas obrigações tributárias.

A MP 783 é desrespeitosa, cínica. Ou é abortada ou estará confirmado que a Nau Brasil afunda mais rápido do que se possa perceber.

Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional)”